Para participar, é necessário realizar inscrição no site da Esmal até 18 de outubro. Arte: Itawi Albuquerque
No próximo dia 23, a Escola Superior da Magistratura (Esmal) irá prestar homenagem ao jurista alagoano Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda, premiado pela Academia Brasileira de Letras, com mais de 300 obras publicadas no Brasil e no exterior. O evento abre a segunda Semana Nacional do Livro e da Biblioteca, que terá início às 18h30, na sede da Esmal, localizada no bairro Farol, em Maceió.
Na ocasião, o professor Osvaldo Zaidan, historiador formado pelo Centro Universitário de Brasília e membro da coordenação do Memorial Pontes de Miranda, irá ministrar palestra sobre a vida e a obra do homenageado. Leia, na entrevista a seguir, o que o professor fala sobre a sobre a importância de preservar a memória do jurista alagoano.
Para participar da atividade e receber certificado de comparecimento, será necessário realizar inscrição no site da Esmal até 18 de outubro, por meio deste link.
No mesmo dia, a Esmal abrirá a exposição ‘Memórias: modos de vida e trabalho’, cedida pelo Tribunal Regional do Trabalho de Alagoas (TRT/AL), em parceria com o Memorial. A mostra ficará disponível para visitação do público até dia 9 de novembro. A exposição apresenta fatos ocorridos entre as décadas 1940 e 1970, por meio de processos trabalhistas ajuizados pelas partes na Justiça do Trabalho de Alagoas.
A Semana Nacional do Livro e da Biblioteca é coordenada pela Biblioteca Geral do Judiciário, tem o objetivo de promover a leitura como fonte de conhecimento e de pensamento crítico. A programação vai até 30 de outubro.
Esmal - A palestra sobre a vida e a obra de Pontes de Miranda será aberta ao público e aos trabalhadores do Judiciário. Por que motivo é tão importante que as pessoas conheçam a vida e a obra do pesquisador?
Osvaldo Zaidan - Quem não gostaria de conhecer uma pessoa que tratou as leis, o Direito, as pessoas, a famílias, os amigos e até os inimigos com respeito com retidão, caráter, gentiliza? Conhecer a obra de pontes de Miranda é, acima de tudo, conhecer a essência das leis. Conhecer exatamente aquilo que a lei representa. Escrever a lei, formular a lei, não é uma tarefa das mais difíceis, mas garantir a sua eficácia, aplicá-la corretamente, extrair dela a sua verdadeira essência, isso é tarefa de poucos. Dentre esses poucos, um dos que mais se destacou foi Pontes de Miranda.
Desde muito cedo ele se tornou jurisconsulto. As suas obras eram escritas depois de pesquisas exaustivas. Ele não se limitava a uma ou duas opiniões, ele procurava em outros autores a interpretação para que pudesse chegar e extrair a essência da interpretação jurídica. Por esse motivo e pela sua história, pelo seu caráter, pela sua fidelidade aos princípios, pelo seu amor à sua pátria e, principalmente, pela sua alegria de viver, eu acho que todos deveriam conhecer não só o jurisconsulto, o matemático, o físico, o escritor, mas também o ser humano Pontes de Miranda.
Esmal - Que contribuições ele deu para a forma como se pensa o Direito – e a sociedade – atualmente?
Osvaldo Zaidan - Pontes de Miranda, desde pequeno foi um apaixonado pelas ciências exatas, pela matemática, pela física. Essas disciplinas tiveram uma grande influência em sua formação enquanto aluno do Direito. Pontes de Miranda estudou Direito procurando dar a ele um sentido lógico, interpretativo, exato. Ele procurou enxergar o Direito e, principalmente, escrever o Direito de forma extremamente racional. Essa racionalidade que ele colocou nos temas que desenvolvia dava às suas obras a precisão exata, a segurança jurídica necessária para que a lei fosse aplicada com eficácia. Pontes de Miranda pensava o Direito de uma forma diferente, muito parecida com a forma de se pensar a matemática. Ele aplicava a lógica à interpretação jurídica e a utilização desse sistema positivo no Direito foi a grande contribuição de Pontes de Miranda para a sociedade. A lei não pode ser interpretada de acordo com os interesses da classe dominante, ela deve ser interpretada de forma racional e esse racionalismo jurídico foi próprio de Pontes de Miranda.
Esmal - Quais as principais curiosidades que as pessoas poderão encontrar na exposição, que também será aberta ao público?
Osvaldo Zaidan - Através da leitura e do conhecimento do conteúdo dos processos trabalhistas, os visitantes poderão desvendar alguns mistérios e conhecer alguns fatos que raramente são retratados pelos livros didáticos. A gente apresenta na exposição, por exemplo, o processo de um condutor de bonde na década de 40. Esse condutor se envolve em um acidente e a empresa acaba demitindo-o por considerá-lo negligente, sem a perícia necessária suficiente para evitar a situação. No entanto, a imprensa e os transeuntes que estavam no dia e no local do acidente acabaram dando aos jornais a verdadeira versão dos fatos, que dizia que a perícia do condutor evitou uma tragédia maior. Nesse sentido, o próprio reclamante se utilizou da imprensa para conseguir convencer o juiz de que, na verdade, ele estava muito longe de ter sito o culpado, ele foi um verdadeiro herói por ter conseguido evitar que o bonde atingisse um número maior de pessoas.
Já em outro processo, a gente verifica o quão grande era a força do presidente Getúlio Vargas. A sua morte conseguiu paralisar o país. Na exposição apresentamos o caso de uma audiência que estava ocorrendo no momento exato em que foi noticiado o seu suicídio. Na ocasião, o juiz do trabalho, doutor Paulo Duarte Quintela Cavalcante, interrompeu a audiência e decretou luto em razão da morte trágica do presidente Getúlio.
No acervo também apresentamos a história de que, após análise da carta-testamento de Getúlio Vargas, sua filha Alzira Vargas descobriu que a carta que foi publicada pela imprensa não era a mesma que foi escrita por ele. Na versão escrita por ele, não aparece a famosa frase “Saio da vida para entrar na história”. Essa frase foi escrita pelo secretário de Vargas, que pegou a carta manuscrita, datilografou e divulgou para a imprensa acrescentando essa expressão, que veio a se tornar uma verdadeira bandeira para que Vargas se tornasse um personagem eternizado.
Vale a pena conferir essa exposição porque a gente percebe que um processo trabalhista revela muito mais do que informações jurídicas e sociais, ele traz em seu seio a verdadeira história desse país.
Esmal - Por que é importante preservar a memória de Pontes de Miranda e de outras pessoas que contribuíram para o desenvolvimento do nosso país?
Osvaldo Zaidan - Porque um país sem memória é um país sem história e a gente não pode deixar de que um país tão grande, tão rico, como é o Brasil, não preserve a sua história. O problema é grave, veja como os governantes vêm tratando a história educacional do Brasil, o que é exemplificado pelo trágico acidente que ocorreu no Museu Nacional do Rio, que consumiu boa parte da história não só do Brasil, mas da própria humanidade, já que existiam inúmeras peças que ajudavam a compreender a história da evolução do homem.
Sobre Pontes de Miranda, é importante que a gente preserve esse exemplo de ser humano, de retidão, de caráter, de justiça social, de igualdade. Ele sempre foi fiel aos seus princípios, nunca se deixou levar pela vaidade, nunca se envolveu diretamente com política porque sabia que isso o afastaria de sua verdadeira missão, pois teria que renunciar aos seus valores e princípios. Preferiu manter-se fiel.
É essa herança deixada por nossos antepassados que torna o Brasil grande. O Brasil vai ser tão grande quanto for a grandeza de sua cultura, já que um país sem cultura é um país sem identidade. E a gente está vendo isso na atualidade. Quanto menos cultura, quanto mais fraco e falho for o sistema educacional, mais próximo ao extremismo a sociedade caminha, o que é muito perigoso.
Carolina Amâncio- Esmal TJ/AL
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